Caixa dos fios

10.3.09

35

Olho para o meu reflexo no espelho. Estão ali, mesmo à minha frente, rugas de expressão. Ganhei-as todas no último ano, quando dei por elas, já estavam comodamente instaladas à volta dos meus olhos. Olho para o meu reflexo no espelho e custa-me a crer que tenho 35 anos. Lembro-me de ser miúda e pensar que quem tinha trintas eram cotas. Não me sinto cota. Ainda me sento com a perna debaixo do rabo, ainda me sento no chão com "pernas à chinês", ainda desço as escadas a correr [e só não desço pelo corrimão porque uso o elevador], mas a minha pele está diferente e tenho muitos cabelos brancos [arranco-os, mas tenho]. Não me sinto com 35 anos, ainda me sinto uma miúda, a mesma que trepava às árvores, que subia e descia muros, que jogava à bola com os rapazes do prédio, que descia o Parque Eduardo VII de skate ou de carrinhos de esferas, a mesma miúda com "pêlo na venta". Ganhei rugas e cabelos brancos, perdi muito do "pêlo na venta" [ganhei maturidade]. Sou hoje o que sonhava ser quando fosse uma "cota", sou mãe, mas sinto-me uma mãe-miúda, uma mulher-miúda, tenho 35 anos e são os "pés de galinha" e os cabelos brancos que mo dizem, eu não os sinto.